Pesquisa visa alertar médicos sobre a provável ineficiência dessa categoria de remédio no combate a um dos distúrbios do sono mais comuns do mundo.
Tratar a insônia crônica, aquela que dura mais de três meses e tira ou atrasa o sono mais de três vezes na semana, é um trabalho lento e que frequentemente inclui o uso de medicamentos de diversas classes – entre eles, os antidepressivos. Só que essa abordagem pode não ser a ideal, especialmente se os remédios forem tomados sozinhos e por muito tempo, como indica uma grande revisão envolvendo 23 estudos e 2 806 pacientes.
No trabalho, publicado pelo centro de análises de pesquisas Cochrane, os cientistas descobriram que a maioria dos estudos feitos com esses fármacos acompanhou os pacientes por pouco tempo e tinha outras limitações que os tornavam de baixa qualidade, como número pequeno de voluntários.
“É preocupante que os antidepressivos sejam usados sem uma base concreta de evidências”, alerta Hazel Everitt, coordenadora do estudo e clínica geral da Universidade de Southampton, no Reino Unido.
Para os autores, os achados mostram a importância de melhorar a abordagem atual do combate a um mal que, estima-se, afeta mais de 10% da população mundial. “É uma oportunidade de mostrar às pessoas que o tratamento da insônia não precisa ser feito só com medicamentos. Aliás, é justamente o contrário”, avalia o pneumologista Pedro Genta, coordenador do Centro de Medicina do Sono do Hospital do Coração (HCor), de São Paulo.
Os remédios e a insônia
Hoje, os mais prescritos são os hipnóticos, que induzem o sono e um estado de sedação no corpo, caso dos benzodiazepínicos e os que levam substâncias conhecidas como drogas “z”. “Só que esses remédios devem ser usados por menos de 30 dias. Ou seja, um curto período de tempo”, orienta Genta.
Isso porque eles causam dependência e tolerância. Logo, é preciso aumentar a dose para que sigam fazendo efeito. “Em longo prazo, podem ainda aumentar o risco de ter um infarto ou AVC”, aponta a neurologista Aline Turbino, especialista em neurossonologia pela Universidade de São Paulo (USP).
Já os antidepressivos, como a trazodona e a amitriptilina, que atuam nos neurotransmissores e também costumam ser prescritos pelos médicos como alternativa aos hipnóticos, foram colocados em xeque no trabalho por não serem indicados oficialmente para a insônia. Os estudos que comprovam a eficácia e segurança deles levaram em conta somente pacientes com depressão.
“Os efeitos colaterais observados nessa classe são boca seca, irritação gastrointestinal, sentimento de estar grogue pela manhã e comprometimento da concentração”, indica Hazel. Os prejuízos não param por aí. “Algumas pesquisas apontam que eles podem afetar funções cerebrais, como a memória”, destaca Luciana Palombini, pneumologista do Instituto do Sono, na capital paulista.
No geral, os remédios são encarados como uma ajuda temporária para devolver o descanso aos insones, mas todos os especialistas ouvidos pela reportagem concordam que é preciso investir em outras táticas para que a melhora seja duradoura.
Acabando com o mal pela raiz
Como a grande maioria dos casos de insônia está ligada a hábitos que prejudicam o descanso, uma das abordagens mais citadas pelos especialistas é a terapia cognitivo-comportamental direcionada para o problema. “É um método eficaz, que corrige comportamentos e crenças em relação ao sono e costuma resolver a queixa em poucas sessões. Mas não existem muitos especialistas nessa abordagem, o que dificulta o acesso a ela”, aponta Genta.
Outro ponto importante é identificar a causa da insônia. “Doenças sistêmicas, transtornos psiquiátricos, como ansiedade e depressão, e até o uso de alguns medicamentos, a exemplo dos anti-hipertensivos, podem levar ao quadro”, aponta Aline. Na dúvida, o melhor é procurar um especialista. Mas é importante frisar que, geralmente, a dificuldade para cair no sono está relacionada pra valer é com hábitos do dia a dia.
Coisas que fazemos sem perceber vão, aos poucos, minando nossa capacidade de se entregar à cama. Por isso, independentemente da origem da insônia, invista na higiene do sono, isto é, um conjunto de medidas que restauram o sagrado descanso diário.
Algumas das estratégias indicadas para dormir melhor:
+ Acorde todo dia no mesmo horário, não importa quando conseguiu dormir. Isso ajudará o corpo a sentir sono no fim do dia.
+ Não use dispositivos eletrônicos como celular e televisão perto do momento de dormir. E deixe-os longe do quarto e da cama.
+ Em vez de checar as redes sociais, faça leituras leves em uma luz suave – pode ser amarelada ou alaranjada.
+ Se o sono for embora, o melhor é levantar da cama e fazer uma atividade relaxante, e não ficar deitado forçando a cabeça a desligar.
+ Invista na meditação. Existem vários tipos e apenas poucos minutos ao dia já têm efeito comprovado na indução e manutenção do sono.
+ O quarto deve ser escuro e silencioso. Se necessário, use um tapa-olho ou protetor de ouvido para reduzir as interferências externas.
+ Fuja de substâncias estimulantes a partir das 18 horas, como a cafeína do café, dos energéticos e dos refrigerantes. O cigarro também tem ação semelhante – mas esse é bom evitar o dia todo.
+ Exercícios são ótimos, até porque o sedentarismo está ligado à insônia. Mas, para algumas pessoas, malhar de noite pode estimular demais o corpo.
Fonte: Revista Saúde